domingo, 18 de setembro de 2011

Mais do Mesmo

Esta semana o Ministro da Educação, Fernando Haddad, afirmou que projeta aumentar o tempo que os alunos brasileiros passam nas escolas. Entende, com razão, que os nossos jovens tem uma carga horária escolar insuficiente. Nosso sistema estabelece a quantidade de 800 horas em um mínimo de 200 dias letivos. Significa uma média de 4 horas diárias. Pouco.
A forma como efetuar o aumento estaria em debate, mas três alternativas se destacam. A primeira é o simples aumento de dias letivos, de 200 para 220. É a predileta do ministro, principalmente por exigir menor investimento na estrutura existente. A segunda seria o aumento na carga horária diária, de 4 horas para até 7 horas. Há nesta opção alternativas em experimentação, entre elas o projeto Mais Educação, em que os alunos participam de oficinas no contra turno escolar. O turno integral efetivo também se enquadra nesta forma. A terceira seria uma união das duas anteriores, aumentando em algumas horas a carga diária e complementando com aumento nos dias letivos.
Procurando dados escolares mundo afora, encontrei o site da FEPESP, Federação dos Professores do Estado de São Paulo (sindicato da rede privada) www.fepesp.org.br, que trás uma tabela apresentada pela OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Vejamos o que diz a FEPESP e a tabela a seguir:

“Haddad disse ter constatado que o número de dias letivos no Brasil é inferior a muitos países. Mas ele não está certo.
A OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico divulgou o relatório Education at a glance 2011, que apontou exatamente o contrário: são poucos os países que possuem mais de 190 dias letivos e o Brasil é um deles.
Nos países da OCDE, os professores lecionam, em média, de 183 a 186 dias, de acordo com o nível de ensino. Apenas quatro países têm 200 ou mais dias letivos e destes, só a Coreia possui 220.”

Trabalho dos professores - número de dias letivos/ano
Países membros da OCDE

Fundamental I (1)
Fundamental II (1)
Ensino Médio (1)
Alemanha
193
193
193
Austrália
197
197
193
Áustria
180
180
180
Bélgica (Flandres)
178
179
179
Bélgica (Valônia)
183
183
183
Canadá
Chile
191
191
191
Coreia
220
220
220
Rep. Tcheca
189
189
189
Dinamarca
200
200
200
Escócia
190
190
190
Eslováquia
187
187
187
Eslovênia
190
190
190
Espanha
176
176
171
Estados Unidos
180
180
180
Estônia
175
175
175
Finlândia
188
188
188
França
Grécia
177
157
157
Hungria
181
181
181
Inglaterra
190
190
190
Irlanda
183
167
167
Islândia
176
176
171
Israel
183
176
176
Itália
172
172
172
Japão
201
201
198
Luxemburgo
176
176
176
México
200
200
176
Noruega
190
190
190
Nova Zelândia
--
--
--
Países Baixos
195
--
--
Polônia
181
179
180
Portugal
175
175
175
Rep. Tcheca
189
189
189
Suécia
--
--
--
Suíça
--
--
--
Turquia
180
--
180
Média OCDE
186
185
181

Outros países

Fundamental I (1)
Fundamental II (1)
Ensino Médio(1)
Argentina
170
171
171
Brasil
200
200
200
China
175
175
175
Indonésia
251
163
163
Rússia
164
169
169

OCDE. Education at a glance 2011, p. 428 .
 
Notas da Fepesp:
(1) No original: primary education, lower secondary education e upper secondary education
(2) No Canadá, o ano letivo tem duração de 190 dias
(3) Na França, o ano letivo é de 144 dias no primário e de 175 a 180 dias no primeiro e segundo ciclo do secundário.

Avaliando esta tabela, entendo que aumentar os dias letivos para 220 é uma solução simplista do governo. Não exige maiores investimentos na estrutura física da escola, não garante maior qualidade no ensino, não subentende contratação de mais professores. Apenas pretende que os atuais professores dêem mais aulas por mais dias, para que os alunos estejam mais tempo “expostos ao ambiente escolar”. Este aumento poderá significar mais um mês para os professores lecionarem, e os efeitos já podem ser adivinhados: estafa, estresse, esgotamento mental, tendinites, problemas de voz, desistência.
Além de pretender fazer economia, a proposta sugere o fortalecimento de uma função colateral da escola, mas que vem sendo tratada quase como prioritária: um local para “cuidar” as crianças enquanto os pais trabalham.
O turno integral é mesmo a melhor e mais efetiva forma de oferecer maior quantidade com qualidade nas aulas. Mas nem o projeto Mais Educação me parece solução, embora funcione bem em muitos lugares. Um mínimo de cem alunos são atendidos por três horas diárias, no turno inverso. Ali, os estudantes participam de oficinas de atividades esportivas, artísticas e reforço escolar. Mas os monitores não são vinculados à escola nem precisam ter formação pedagógica. Recebem uma bolsa auxílio de baixo valor. Escolas pequenas simplesmente não tem como receber o total de alunos em tempo integral, de forma que algumas das oficinas são realizadas em galpões de associações e clubes. Assim, o Mais Educação é a terceirização do contra turno.
Entendo que o MEC e os governos estaduais devem assumir suas responsabilidades e não inventar “jeitinhos” para aumentar a jornada dos estudantes. A solução passa por pesados investimentos, para que as escolas possam atender os alunos em turno integral de verdade. O espaço físico deve ser adequado para isto, dos pátios aos refeitórios, das quadras de esportes aos banheiros. Novas escolas devem ser construídas. Professores e especialistas devem ser contratados.
Do contrário, o ensino brasileiro estará apenas oferecendo mais do mesmo, sem abordar o principal. Propostas como o aumento de dias letivos servem para chamar atenção, causam debate, dão destaque para os proponentes, o que é bom para quem pretende disputar eleições ano que vem, como o ministro.

domingo, 11 de setembro de 2011

Meu 11 de Setembro

Neste domingo completam-se dez anos do atentado que será lembrado para sempre, independente das opiniões, pela dimensão, significados, conseqüências práticas e no âmbito das mentalidades. Muitas coisas mudaram nestes dez anos, algumas sob influência direta do 11 de Setembro de 2001. O fechamento desta primeira década merece de fato o número de reflexões e retrospectivas que vem recebendo. Mas o que ainda poderia ser dito sobre o assunto que não tenha recebido já longas considerações?
Fácil: a experiência pessoal de cada um. Como o 11/09 refletiu em cada indivíduo nenhum especialista tem como abordar. O meu caso, me parece que vale a pena escrevê-lo, embora não tenha a certeza de que vale a pena lê-lo. Faço, pois, a minha parte, e meus turistas que decidam se farão a sua!
Andava no segundo ano como professor. Pela manhã, no momento dos ataques, estava na escola Brigadeiro Antônio Sampaio e pela tv assisti a primeira torre em chamas, ainda de pé. Minutos após, retorno e descubro que, se um raio não cai duas vezes no mesmo lugar, o mesmo não se pode dizer de aviões seqüestrados: a segunda torre havia sido atingida da mesma forma que a outra. Não dava mais para desgrudar da tela, me somei aos milhões que assistiram em tempo real o desenrolar dos fatos, que culminaram com a implosão do World Trade Center inteiro.
Mas foram os dias que se seguiram que ficaram marcados na minha lembrança, chamaram atenção para a relevância da profissão que tinha escolhido e que há pouco começara a exercer. Sem encontrar explicações no presente, muitos dos meios de comunicação se socorreram dos historiadores para que o passado pudesse oferecer indícios.
Como ninguém ficou indiferente, nas salas de aula também os professores de história foram requisitados a se manifestarem. Nas minhas aulas, sempre surgia a pergunta sobre os atentados. Era uma tarefa da qual não podíamos nem queríamos nos esquivar, o interesse dos alunos é combustível que não se despreza em hipótese alguma. Aliás, para um ex aluno do professor Enrique Padrós, do Departamento de História da UFRGS, abordar a História do tempo imediato era mais do que uma oportunidade, um compromisso. Assim foi que nas aulas seguintes fizemos todos o esforço de tentar compreender, sob a luz de acontecimentos prévios, quem e o que estaria por trás dos ataques ao coração econômico do mundo capitalista. Histórico de ações de grupos extremistas, contexto geo-político, piora nas relações entre Israel e Palestina, posicionamento radical dos EUA em questões ambientais e intromissão americana na política de alguns países, existência de poderosos grupos ultra-conservadores americanos pressionando por maior agressividade ainda.
Enfim, parece que, em geral, os historiadores não se afastaram muito daquelas respostas que com o tempo foram se confirmando. Restou para mim este momento de confirmação profissional, que ficou simbolizada em uma das aulas no Colégio Antônio de Castro Alves em que, perguntado sobre o ataque pelo aluno Alexandre, infelizmente já falecido em um acidente, passei a fazer todas as considerações e abordagens já citadas, ao fim das quais, aconteceu uma coisa que nunca mais vou esquecer: a turma toda me aplaudiu. Não aquelas palmas protocolares ao fim de discursos ou de apresentações. Pela primeira vez era aplaudido pelos alunos porque estavam satisfeitos com a aula.