Esta semana o Ministro da Educação, Fernando Haddad, afirmou que projeta aumentar o tempo que os alunos brasileiros passam nas escolas. Entende, com razão, que os nossos jovens tem uma carga horária escolar insuficiente. Nosso sistema estabelece a quantidade de 800 horas em um mínimo de 200 dias letivos. Significa uma média de 4 horas diárias. Pouco.
A forma como efetuar o aumento estaria em debate, mas três alternativas se destacam. A primeira é o simples aumento de dias letivos, de 200 para 220. É a predileta do ministro, principalmente por exigir menor investimento na estrutura existente. A segunda seria o aumento na carga horária diária, de 4 horas para até 7 horas. Há nesta opção alternativas em experimentação, entre elas o projeto Mais Educação, em que os alunos participam de oficinas no contra turno escolar. O turno integral efetivo também se enquadra nesta forma. A terceira seria uma união das duas anteriores, aumentando em algumas horas a carga diária e complementando com aumento nos dias letivos.
Procurando dados escolares mundo afora, encontrei o site da FEPESP, Federação dos Professores do Estado de São Paulo (sindicato da rede privada) www.fepesp.org.br, que trás uma tabela apresentada pela OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Vejamos o que diz a FEPESP e a tabela a seguir:
“Haddad disse ter constatado que o número de dias letivos no Brasil é inferior a muitos países. Mas ele não está certo.
A OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico divulgou o relatório Education at a glance 2011, que apontou exatamente o contrário: são poucos os países que possuem mais de 190 dias letivos e o Brasil é um deles.
Nos países da OCDE, os professores lecionam, em média, de 183 a 186 dias, de acordo com o nível de ensino. Apenas quatro países têm 200 ou mais dias letivos e destes, só a Coreia possui 220.”
Trabalho dos professores - número de dias letivos/ano | |||
Países membros da OCDE | |||
| Fundamental I (1) | Fundamental II (1) | Ensino Médio (1) |
Alemanha | 193 | 193 | 193 |
Austrália | 197 | 197 | 193 |
Áustria | 180 | 180 | 180 |
Bélgica (Flandres) | 178 | 179 | 179 |
Bélgica (Valônia) | 183 | 183 | 183 |
Canadá | |||
Chile | 191 | 191 | 191 |
Coreia | 220 | 220 | 220 |
Rep. Tcheca | 189 | 189 | 189 |
Dinamarca | 200 | 200 | 200 |
Escócia | 190 | 190 | 190 |
Eslováquia | 187 | 187 | 187 |
Eslovênia | 190 | 190 | 190 |
Espanha | 176 | 176 | 171 |
Estados Unidos | 180 | 180 | 180 |
Estônia | 175 | 175 | 175 |
Finlândia | 188 | 188 | 188 |
França | |||
Grécia | 177 | 157 | 157 |
Hungria | 181 | 181 | 181 |
Inglaterra | 190 | 190 | 190 |
Irlanda | 183 | 167 | 167 |
Islândia | 176 | 176 | 171 |
Israel | 183 | 176 | 176 |
Itália | 172 | 172 | 172 |
Japão | 201 | 201 | 198 |
Luxemburgo | 176 | 176 | 176 |
México | 200 | 200 | 176 |
Noruega | 190 | 190 | 190 |
Nova Zelândia | -- | -- | -- |
Países Baixos | 195 | -- | -- |
Polônia | 181 | 179 | 180 |
Portugal | 175 | 175 | 175 |
Rep. Tcheca | 189 | 189 | 189 |
Suécia | -- | -- | -- |
Suíça | -- | -- | -- |
Turquia | 180 | -- | 180 |
Média OCDE | 186 | 185 | 181 |
Outros países | |||
| Fundamental I (1) | Fundamental II (1) | Ensino Médio(1) |
Argentina | 170 | 171 | 171 |
Brasil | 200 | 200 | 200 |
China | 175 | 175 | 175 |
Indonésia | 251 | 163 | 163 |
Rússia | 164 | 169 | 169 |
OCDE. Education at a glance 2011, p. 428 .
Notas da Fepesp:
(1) No original: primary education, lower secondary education e upper secondary education
(2) No Canadá, o ano letivo tem duração de 190 dias
(3) Na França, o ano letivo é de 144 dias no primário e de 175 a 180 dias no primeiro e segundo ciclo do secundário.
Avaliando esta tabela, entendo que aumentar os dias letivos para 220 é uma solução simplista do governo. Não exige maiores investimentos na estrutura física da escola, não garante maior qualidade no ensino, não subentende contratação de mais professores. Apenas pretende que os atuais professores dêem mais aulas por mais dias, para que os alunos estejam mais tempo “expostos ao ambiente escolar”. Este aumento poderá significar mais um mês para os professores lecionarem, e os efeitos já podem ser adivinhados: estafa, estresse, esgotamento mental, tendinites, problemas de voz, desistência.
Além de pretender fazer economia, a proposta sugere o fortalecimento de uma função colateral da escola, mas que vem sendo tratada quase como prioritária: um local para “cuidar” as crianças enquanto os pais trabalham.
O turno integral é mesmo a melhor e mais efetiva forma de oferecer maior quantidade com qualidade nas aulas. Mas nem o projeto Mais Educação me parece solução, embora funcione bem em muitos lugares. Um mínimo de cem alunos são atendidos por três horas diárias, no turno inverso. Ali, os estudantes participam de oficinas de atividades esportivas, artísticas e reforço escolar. Mas os monitores não são vinculados à escola nem precisam ter formação pedagógica. Recebem uma bolsa auxílio de baixo valor. Escolas pequenas simplesmente não tem como receber o total de alunos em tempo integral, de forma que algumas das oficinas são realizadas em galpões de associações e clubes. Assim, o Mais Educação é a terceirização do contra turno.
Entendo que o MEC e os governos estaduais devem assumir suas responsabilidades e não inventar “jeitinhos” para aumentar a jornada dos estudantes. A solução passa por pesados investimentos, para que as escolas possam atender os alunos em turno integral de verdade. O espaço físico deve ser adequado para isto, dos pátios aos refeitórios, das quadras de esportes aos banheiros. Novas escolas devem ser construídas. Professores e especialistas devem ser contratados.
Do contrário, o ensino brasileiro estará apenas oferecendo mais do mesmo, sem abordar o principal. Propostas como o aumento de dias letivos servem para chamar atenção, causam debate, dão destaque para os proponentes, o que é bom para quem pretende disputar eleições ano que vem, como o ministro.